quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Chicos espertos

Photo by Mufid Majnun on Unsplash

 

Uma das muitas coisas que nos distingue de povos nórdicos, como os finlandeses, noruegueses ou suecos, é a nossa atitude perante os impostos. Para um nórdico, seria impensável fugir aos impostos. De facto, são os cidadãos os primeiros a querer pagar impostos, pois para eles está claro que estão a contribuir para o funcionamento e progresso do seu país, para serviços de saúde, educação e segurança que beneficiam todos. É certo que os nórdicos ganham, em média, muito mais do que nós, mas a fatia dos seus rendimentos que vai para os impostos é muito maior, para além do custo de vida ser muito mais caro.

 

Já nós, portugueses, só pagamos se formos mesmo obrigados. Para nós, o Estado rouba-nos, mexe nos nossos bolsos, persegue-nos e, por isso, há que fugir por todos os meios. Queremos – e estamos sempre a exigir – melhores serviços do Estado, mas que sejam os outros a pagar, porque nós já pagamos demasiado.

 

É claro que isto decorre muito da cultura na qual nos inserimos, que anda à volta do individualismo, do egoísmo, da falta de respeito pelo próximo e pela sociedade, da culpa que nunca é nossa e sempre dos outros, da exceção que nos exclui do cumprimento da lei, do desenrascanço, e do “chico-espertismo” que nos permite ultrapassar o parceiro, pensar primeiro em nós e não contribuir para o bem comum.

 

Devo confessar, no entanto, que, apesar do muito orgulho e prazer que tenho em ser português, a minha atitude perante os impostos e a sociedade pende muito mais para os nórdicos do que para os meus concidadãos. Gosto de contribuir para a construção de um país como Portugal, esperando que o país defenda, respeite e apoie todos os que dele fazem a sua pátria. Saúde, educação, segurança e demais serviços são essenciais numa sociedade justa e moderna. Por isso não preciso que me expliquem a importância de contribuir com o meu dinheiro para o bem comum.

 

Infelizmente, as minhas convicções são fortemente abaladas quando vejo, com espanto, que dinheiro dos contribuintes é utilizado para contratações polémicas, para as quais a única justificação perante a opinião pública é a de que a pessoa tem o “perfil adequado”. Porque é insólito que um recém-licenciado, de 21 anos, com uma experiência que, forçosamente, é limitada, tenha um perfil útil para adjunto da Srª Ministra da Presidência, seria muito importante que o tal “perfil adequado” fosse cuidadosamente explicado a todos nós, para afastar quaisquer dúvidas. 

 

É claro que a Srª Ministra da Presidência pode sempre dizer que nada tem que explicar à opinião pública, que foi cumprida a lei e já está. Contrata-se porque se pode! Paga-se um vencimento que é praticamente o triplo do salário médio nacional porque sim. Não há nada de ilegal nisso. Mas com tudo isto, quem acredita, como eu, no ideal de contribuir para um País que aplica bem e criteriosamente os fundos públicos fica profundamente desiludido, e ganham força os individualistas, os egoístas, os oportunistas e os “chicos espertos”.