terça-feira, 15 de dezembro de 2015

O preço das vistas curtas


Só em poucos momentos da nossa história, todos eles longínquos, tivemos, como país, a visão e a sorte de tomar decisões a pensar no medio ou longo prazo. São, diria eu, aqueles “acidentes” típicos da genética, nos quais um indivíduo sofre mutações de forma a que possam ser exploradas novas vias de evolução. Mas a verdade é que a nossa “genética”, a dos portugueses, é a do status quo, a do imediato, a do horizonte visível que afeta o dia-a-dia e não mais do que isso.

Por isso sempre nos preocupámos muito mais com o preço da mão-de-obra do que com ela própria, com o “comerciozinho” do que com o desenvolvimento, com a cobrança do imposto do que com o progresso geral, com a geração que detém o poder do que com as que a precederam e as que se lhe seguem, com os interesses dos grandes do que com os interesses da nação.

Disso é exemplo a educação. Muitas vezes tivemos excelentes cientistas, que se destacaram no mundo, mas nunca investimos verdadeiramente na educação generalizada. O resultado é um atraso crónico do país, que não é de agora mas que também existe agora e continuará por muito tempo. A educação de um povo sai muito cara, exige recursos importantes que são necessários para outras áreas, dirão uns. Mas o que é certo é que a não educação sai muitíssimo mais cara e condena o país a ir na cauda do progresso dos outros, arrastado por eles e pagando fortunas para isso.

Outro exemplo é o do desinvestimento nas pessoas. Pensa-se nas grandes empresas, nos grandes interesses económicos, nas “áreas estratégicas”, e tudo se sacrifica a esses valores. Pobre é o país que não entende que estratégicas são as pessoas. Por muito que ilustres economistas (aos quais devemos as crises nacionais e internacionais que assolam o mundo de hoje) o digam, um país não é nem pode ser uma empresa (e muito menos a empresa para a qual esses economistas trabalham). Um país são as pessoas que lhe dão corpo e vida, que o fazem funcionar e lhe dão sentido. E por isso todos contam: recém-nascidos, jovens, adultos, idosos. Todos fazem o país avançar. Mas quando veremos nós em Portugal políticos e políticas centrados nos cidadãos, mais do que no contribuinte e nas "endeusadas" empresas? 


São, entendo, conceitos que muitos considerarão completamente errados. Se não fosse assim não estávamos como estamos. Como se pode pedir a uma pessoa de vistas curtas que veja para lá dos poucos metros que alcança? Como se lhes pode explicar que todos pagamos um preço demasiado alto por essas vistas curtas e que esse preço é o atraso que, é certo, beneficia uns poucos mas que atrofia o país inteiro?

sábado, 5 de dezembro de 2015

O obstáculo


Gostava muito de viver num país que tivesse uma fundação que apoiasse a ciência e a tecnologia, que verdadeiramente a incentivasse, que ajudasse cientistas e investigadores a explorarem todo o seu potencial que, frequentemente, só é explorado e valorizado quando eles se encontram fora do país. Aí sim, quando emigram para outras terras que lhes dão condições e se destacam, é fácil dizer que os nossos cientistas são excelentes.

Em vez disso, o que eu vejo é uma burocratização da ciência e da tecnologia, que por vezes chega à raia da tirania processual, em que se obriga investigadores a executar todo o tipo de manobras administrativas, em que se lhes castiga com relatórios sem sentido, em que se antevê como que um deleite extremo (há outra palavra para isto, claro) em encontrar um obstáculo inultrapassável, sempre burocrático, à necessária liberdade e imprevisibilidade da ciência, em descobrir que determinado procedimento não foi seguido, em chegar à conclusão de que determinada despesa não é elegível porque não foi prevista quatro anos atrás quando a proposta de projeto foi submetida. Que delícia! Isso é que é fazer avançar o país!

Infelizmente, vê-se muito disto por estas bandas, em muitos setores (ou sectores, como se escrevia antigamente). Muitos serviços, e respetivos agentes, existem para levantar obstáculos, não para apoiar, não para resolver problemas, não para encontrar soluções ou para melhorar o que seja. É mau em todas as áreas, mas creio que na área da ciência é terrivelmente prejudicial. Estamos na era da ciência e da tecnologia. Pobre é o país que não investe nelas ou que lhes levanta obstáculos continuamente, pois essa é a melhor forma de deixar que outros decidam o seu futuro.